Mestre Eckhart – O melhor dom 1

Sermão 4 - O melhor dom

  1. «O melhor dom de Deus, e a perfeição, vêem de cima, do Pai das luzes.» (São Tiago, 1, 17)1
  2. São Tiago diz na carta: «O melhor dom de Deus, e a perfeição, vêem de cima, do Pai das luzes.»
  3. Prestem atenção! Saibam isto: aqueles que se abandonam a Deus e procuram apenas a sua vontade com todo o seu zelo, o que quer que Deus dê a um tal ser humano, é o melhor: tu, tem a certeza disto, assim como tu tens a certeza que Deus vive; isto é necessariamente o melhor e nenhum outro modo poderia ser melhor.
  4. Se acontecer que qualquer outra coisa te parecesse ser melhor, ela não seria no entanto melhor para ti, porque Deus quer esse modo e não outro modo, e é preciso necessariamente que esse modo seja para ti o melhor modo.
  5. Quer seja doença ou pobreza, ou fome ou sede, ou o que quer que seja que Deus te impõe, ou não te impõe, te dá ou não te dá, tudo isso é o melhor para ti; que seja piedade ou interioridade, que não tenhas nem uma nem a outra, e o que quer que tu tenhas ou que tu não tenhas: estabelece-te bem apenas nessa disposição de considerar em todas as coisas a honra de Deus, e o que quer que ele te reserve então, é o melhor.2

Notas

  1. O ponto de partida do sermão é o versículo de São Tiago, 1, 17: «Omne datum optimum et omne donum perfectum desursum est.» Jacobi I. ]
  2. O problema que aborda Mestre Eckhart no início deste sermão ultrapassa em muito as opiniões «livres», como por exemplo a propósito da prioridade do intelecto ou da vontade entre as potências da alma. Sobre o ponto que ele aborda aqui, nós nunca o encontraremos em flagrante delito de contradição consigo próprio, porque é o próprio fundo da doutrina evangélica que está para ele em questão. Ele regressará a este ponto frequentemente, mas sem nunca transigir.
    Desde as suas «Instruções Espirituais», ele tinha dito aos seus noviços: quando o ser humano procura unicamente a vontade de Deus «... o que então Deus lhe envia... que ele considere isso como sendo aquilo que mais quer para ele, e que ele fique completamente e totalmente satisfeito com isso.» Deus, com efeito, só pode querer o bem, «quer seja doença ou pobreza, ou fome, ou sede...». Eckhart suprime aqui, não «o problema do mal», termo ambíguo no sentido que inclui também o pecado, mas o escândalo do sofrimento gratuito aparentemente imerecido.
    Este sermão ofereceu um pasto abundante aos críticos que criticaram Eckhart por ter dito que o que Deus dá ao ser humano é sempre o melhor para ele. Mas o Mestre não se retratou. Na primeira resposta, apoiou-se em Mateus 6, 10: «Seja feita a tua vontade», e na segunda resposta, apoiou-se sobre um texto das «Confissões» de Santo Agostinho.
    Os críticos acusaram também Eckhart de pretender que era preciso amar o próximo não em vista do bem pelo qual nos amamos a nós próprios, mas amá-lo tanto quanto a nós próprios. Na primeira resposta, o Mestre insistiu ainda com mais força citando Mateus 22, 39, Lucas 10, 27, Marcos 12, 31, textos onde Santo Agostinho também se apoiou. A segunda resposta foi semelhante à precedente, com algumas variantes quanto à apresentação: aquele que ama Deus com toda a sua capacidade, e todas as criaturas nele, não tem mais razões de amar mais uma que a outra. [  ]
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