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A mostrar mensagens de janeiro, 2012

Mestre Eckhart – Daniel o profeta diz: nós te seguimos

O ser humano tem o espírito de sabedoria quando ele considera todas as coisas como um puro nada É verdadeiramente uma loucura o pedir a Deus qualquer outra coisa que não seja Ele O dom de sabedoria é o mais nobre dos sete dons do Espírito Santo São Paulo desejava estar separado de Deus, por Deus, e pelos seus irmãos A verdadeira cruz consiste em se renunciar para obedecer à vontade divina Não se pode conceber Deus sem a alma, nem a alma sem Deus, de tal forma eles são um A alma não tem diferença com Nosso Senhor Jesus Cristo, senão o de ter um ser mais grosseiro Aquele que viu Deus e o provou, não o abandona e continua a correr atrás dele O conhecimento procura Deus e apreende-o na sua raiz, mas a vontade fica no exterior e liga-se à bondade Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Daniel o profeta diz: nós te seguimos

Mestre Eckhart – Daniel o profeta diz: nós te seguimos 1

Sermão 59 - Daniel o profeta diz: nós te seguimos O profeta Daniel diz: «Nós te seguimos com todo o coração, e nós te tememos, e nós procuramos o teu rosto.» (Dn 3, 41) 1 Estas palavras adaptam-se bem àquelas que eu disse ontem: «Eu chamei-o, eu convidei-o, eu atraí-o, e o espírito de sabedoria veio a mim, e eu estimei-o mais do que todos os reinos, e o poder, e o domínio, e o ouro, e a prata, e as pedras preciosas, e comparadas ao espírito de sabedoria, eu considerei todas as coisas como um grão de areia, como lama, e como um nada.» É um sinal manifesto que o ser humano tem o «espírito de sabedoria» quando ele considera todas as coisas como um puro nada. Naquele que pode considerar o que quer que seja como qualquer coisa, o «espírito de sabedoria» não existe. Que ele tenha dito «como um grão de areia», era muito pouco; que ele tenha dito «como lama», era ainda muito pouco; que ele tenha dito «como um nada», estava bem dito, porque todas as coisas são um puro nada comparada

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Ora ele (o sábio) diz: «Com o espírito de sabedoria, todo o bem me veio ao mesmo tempo.» O dom de sabedoria é o dom mais nobre entre os sete dons. Deus não faz nenhum destes dons sem se dar Ele próprio primeiro, da mesma maneira, e na geração. Tudo aquilo que é bom e que pode trazer alegria e consolação, eu tenho tudo no «espírito de sabedoria», e toda a doçura, por forma que ele não é omisso nem mesmo em algo tão pequeno quanto a ponta de uma agulha, e no entanto seria pouca coisa se não o tivesse em plenitude e igualdade, absolutamente como Deus desfruta dele; eu desfruto dele portanto da mesma maneira, da mesma coisa na sua natureza. Porque no «espírito de sabedoria», ele age em plena igualdade, tão bem que a mais pequena coisa se torna como a maior, mas não a maior como a mais pequena, da mesma forma que se enxerta um ramo nobre num sujeito grosseiro, todo o fruto fica conforme à nobreza do ramo, não conforme à grosseria do sujeito. Passa-se o mesmo neste espírito, entã

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Existe na alma uma potência mais vasta que todo o mundo. É preciso que ela seja muito vasta visto que Deus reside nela. Certas gentes não convidam o «espírito de sabedoria», elas convidam a saúde, e a riqueza, e o prazer, mas o «espírito de sabedoria» não vem a elas. Aquilo que elas pedem é-lhes mais caro que Deus – como aquele que dá um pfennig por um pão, prefere o pão ao pfennig -, elas fazem de Deus seu criado. «Faz-me isto e cura-me», diria uma pessoa rica, «pede-me o que tu queres e eu te darei», se ele pedisse então um heller , seria uma aberração, e se ele lhe pedisse cem marcos, ele (o rico) dar-lhos-ia. É por isso que é verdadeiramente uma loucura o pedir a Deus qualquer outra coisa que não seja Ele; é indigno d'Ele porque Ele não dá nada mais voluntariamente que a Ele próprio. Um mestre diz: todas as coisas têm um porquê, mas Deus não tem porquê, e o ser humano que pede a Deus qualquer coisa mais que Ele próprio, faz de Deus um «porquê». 1 Notas P

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São Paulo desejava estar separado de Deus, por Deus, e pelos seus irmãos. Sobre este assunto, os mestres têm grandes dificuldades e muitas hesitações. Certos dizem: ele pensava: «um momento». Não é absolutamente nada verdadeiro: de tão mau grado um instante quanto eternamente, e de tão bom grado eternamente quanto um instante. Quando o ser humano considera a vontade de Deus, quanto mais tempo isso fosse, mais ele ficaria satisfeito, e mais o tormento seria grande, mais ele ficaria satisfeito. Tal como um comerciante que, se ele soubesse de forma certa que aquilo que ele comprou por um marco lhe rendesse dez, empregaria tantos marcos quantos possuísse e qualquer que fosse a dificuldade que ele tivesse, se ele estivesse certo de regressar a casa são e salvo e de ganhar com isso tanto mais, tudo isso lhe seria agradável. Era assim para São Paulo: aquilo que ele sabia ser a vontade de Deus, quanto mais longo fosse, mais ele estava satisfeito, e mais o tormento durava, maior e

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«Renuncia-te a ti próprio e pega na tua cruz.» Os mestres dizem que as penas são o jejum e outras penitências. Mas eu digo que isso é suprimir a pena porque apenas a alegria é a consequência desse comportamento. Em seguida ele (Cristo) diz: «Eu dou-lhes a vida.» Muitas outras coisas que possuem as criaturas dotadas de intelecto são «acidente», mas a vida é própria a cada criatura dotada de intelecto como sendo o seu ser. É por isso que ele diz: «Eu dou-lhes a vida», porque o seu ser é a sua vida, e Deus dá-se absolutamente quando Ele diz: «eu dou». Nenhuma criatura seria capaz de a dar (a vida) mas se fosse possível que uma criatura a pudesse dar, Deus ama tanto a alma que Ele não poderia tolerar isso: Ele quer ser Ele próprio a dá-la. Se uma criatura a desse, a alma a consideraria sem valor, ela não faria caso dela mais do que de um mosquito. Tal como se um imperador desse uma maçã a qualquer um, este atribuir-lhe-ia mais valor do que se uma outra pessoa lhe desse um

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Ora ele diz: «Eu e o Pai nós somos um.» A alma em Deus e Deus nela. Se metessem água num vaso, o vaso rodearia a água, mas a água não penetraria no vaso nem o vaso na água, mas a alma é com efeito um com Deus, de tal forma que eles não podem ser compreendidos um sem o outro. Pode-se conceber bem o calor sem o fogo e a luz sem o sol, mas não se pode conceber Deus sem a alma, nem a alma sem Deus, de tal forma eles são um. 1 Notas Cristo diz: «Eu e o Pai, nós somos um»: a alma em Deus e Deus nela. A comparação do vaso e do vinho encontra-se já no sermão 16b, Como um vaso de ouro . Nós lemos em seguida uma asserção bastante insólita: «Pode-se conceber bem o calor sem o fogo e a luz sem o sol, mas não se pode conceber Deus sem a alma nem a alma sem Deus, tanto eles são um.» Nós reencontramos assim, nestes sermões, textos apresentados de forma bastante abrupta sobre a identidade entre o fundo da alma e o fundo de Deus. Eles não se podem inserir no conjunto da doutrina eckhart

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A alma não tem diferença com Nosso Senhor Jesus Cristo, senão o de a alma ter um ser mais grosseiro, porque o ser dele (Cristo) está unido à Pessoa eterna. Tanto quanto ela (a alma) se afasta do seu caráter grosseiro – e como não pode ela separar-se dele absolutamente! – tanto ela é totalmente idêntica a ele, e tudo aquilo que se pode dizer de Nosso Senhor Jesus Cristo, poder-se-ia dizê-lo da alma. 1 Notas Aquilo que se segue é também de grande dificuldade, mas Eckhart deu-nos noutro local a demonstração válida (sermão 24, São Paulo diz ): «... Deus tomou a natureza humana em si e uniu-a à sua pessoa... Ele assumiu a natureza humana essencialmente e não um ser humano...» Eis porque este sermão 59 nos diz que a alma não tem, na sua natureza, diferença com Nosso Senhor, o seu ser é apenas mais grosseiro porque o ser de Cristo está unido à Pessoa eterna. Quanto mais a alma se afasta desse caráter grosseiro, mais ela é idêntica a ele. [  ↑  ] [ Anterior ] [ Índice

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Um mestre diz: a menor coisa de Deus enche todas as criaturas, e a sua grandeza não está em parte nenhuma. Eu vou-vos contar uma história. Alguém perguntava a uma pessoa boa porque é que ela tinha por vezes tanto gosto pela devoção e pela oração, e porque é que outras vezes ela não tinha. Foi-lhe assim respondido: o cão que vê a lebre, fareja-a e descobre-lhe o rasto, corre atrás da lebre; os outros vêm-no a correr bastante e correm também, mas em breve eles se cansam e param. É assim daquele que viu Deus e o provou, ele não abandona e continua a correr. A este propósito David diz: «Provem e vejam quanto o Senhor é doce!» Esta pessoa não se cansa, mas as outras cansam-se rapidamente. Certas pessoa correm à frente de Deus, certas ao lado de Deus, outras seguem Deus. Aquelas que correm à frente de Deus são aquelas que seguem a sua vontade própria e não aquiescem à vontade de Deus, é absolutamente mal. As outras, que vão ao lado de Deus, dizem: «Senhor, eu não quero na

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Ora ele diz: «Nós procuramos o teu rosto». Verdade e bondade são uma veste de Deus. Deus está acima de tudo o que nós podemos exprimir em palavras. O conhecimento procura Deus e apreende-o na sua raiz de onde emanam o Filho e toda a Divindade, mas a vontade fica no exterior e liga-se à bondade, porque a bondade é uma veste de Deus. Os anjos mais elevados apreendem Deus no seu vestiário antes dele ser revestido de bondade ou de qualquer outra coisa que se pode exprimir por palavras. É por isso que ele diz: «Nós procuramos o teu rosto», porque o rosto de Deus é o seu ser. 1 Que Deus nos ajude a compreendê-lo e que estejamos prontos para possui-lo. Amém. 2 Notas «Nós procuramos o teu rosto.» Tal é o último membro da frase na citação do profeta Daniel no início do sermão. O conhecimento procura Deus e apreende-o na sua raiz de onde saiu o Filho, de onde saiu toda a Divindade, mas a vontade permanece no exterior e liga-se à bondade. Ora a verdade e a bondade são uma ve

Mestre Eckhart – Aquele que me serve

Todos aqueles que querem seguir Deus devem deixar tudo aquilo que os pode impedir de ir a Deus É um fiel servidor aquele que, em todas as suas obras, não procura nada para além da honra de Deus É uma recompensa por demais grande, que todos aqueles que o servem, devam residir com Ele na união Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Aquele que me serve

Mestre Eckhart – Aquele que me serve 1

Sermão 58 - Aquele que me serve Nosso Senhor Jesus Cristo pronunciou estas palavras: «Aquele que me serve, que ele me siga e onde eu estou, lá o meu servidor estará comigo.» (Jo 12, 26) 1 Nestas palavras podem-se notar três coisas. A primeira, é que se deve seguir e servir Nosso Senhor visto que ele diz: «Aquele que me serve deve seguir-me». É por isso que estas palavras convêm a São Segundo, o qual significa «quem segue Deus», porque ele deixou por Deus os seus bens, e a sua vida, e todas as coisas. Da mesma maneira, todos aqueles que querem seguir Deus devem deixar tudo aquilo que os pode impedir de ir a Deus. Crisóstomo diz: é uma asserção penosa para aqueles que se voltaram para este mundo e para as coisas corporais, porque para esses é muito doce possui-las; difícil e amargo de as deixar. Com isto, pode-se notar quanto é penoso para certas gentes, que não conhecem nada das coisas espirituais, o deixarem todas as coisas corporais. Como eu disse frequentemente, por

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O segundo ponto: de que maneira nós devemos seguir Nosso Senhor. Santo Agostinho diz: «Aquele é um fiel servidor que, em todas as suas obras, não procura nada para além da honra de Deus.» Monsenhor David diz também: «Deus é o meu Senhor, eu devo servi-lo» porque Ele serviu-me e em todo o seu serviço, Ele não tinha necessidade de mim a não ser para a minha própria utilidade, assim eu devo servi-lo em retorno e procurar a sua honra só. O que não fazem outros mestres: eles procuram o interesse próprio deles nos serviços deles, porque eles prestam-nos apenas para nos explorar. É por isso que nós não somos obrigados a prestar-lhes grandes serviços: a reciprocidade deve ser segundo a grandeza e a nobreza do serviço. 1 Notas Numa segunda parte, o pregador mostra como nós devemos servir Deus e não procurar nada senão a honra de Deus. E, diz «David»: «Deus é o meu Senhor, eu devo servi-lo, porque Ele serviu-me e em todo o seu serviço Ele não tinha necessidade de mim a não ser

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O terceiro ponto: nós estaremos atentos a esta recompensa de que fala Nosso Senhor: «Onde eu estou, lá o meu servidor estará comigo.» Onde é a residência de Nosso Senhor Jesus Cristo? Na união com o Pai. É uma recompensa por demais grande, que todos aqueles que o servem, devam residir com Ele na união. É por isso que São Filipe diz, quando Nosso Senhor falou do seu Pai: «Senhor, mostra-nos o teu Pai, isso chega-nos.» Como se ele dissesse que vê-lo ser-lhe-ia suficiente. Mas nós teremos uma bem maior satisfação em residir com Ele. Quando Nosso Senhor foi transfigurado sobre a montanha, e deu um vislumbre da glória do céu, São Pedro também pediu a Nosso Senhor para ficar lá eternamente. Nós deveríamos ter um desejo infinitamente grande de união com o Nosso Senhor Deus. Deve-se reconhecer a união com o Nosso Senhor Deus por esta distinção: da mesma forma que Deus é três, nas suas Pessoas, Ele é um, na sua natureza. Deve-se compreender assim a união de Nosso Senhor Je

Mestre Eckhart – Vi a Cidade Santa, uma Nova Jerusalém

Esta «cidade» designa a tua alma espiritual A paz faz com que as criaturas se inclinem e regressem para Deus A santidade é toda pureza, liberdade, perfeição Se o ser humano se quer tornar puro, que ele deixe as coisas terrestres Quando nós estamos unidos a Deus, nós tornamo-nos «novos» Nós devemos verdadeiramente amar as coisas que nos conduzem a Deus A luz divina aparece a cinco tipos de pessoas Aquele que quer conhecer Deus, e não está ornamentado com obras divinas, é rejeitado para o mal Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Vi a Cidade Santa, uma Nova Jerusalém

Mestre Eckhart – Vi a Cidade Santa, uma Nova Jerusalém 1

Sermão 57 - Vi a Cidade Santa, uma Nova Jerusalém Vi a Cidade Santa, uma Nova Jerusalém, descer do céu, desde junto de Deus. (Ap 21, 2) 1 São João viu «uma cidade». Uma «cidade» designa duas coisas: uma, é que ela é fortificada, tão bem que ninguém a pode prejudicar, a outra, é a união entre os habitantes. Esta cidade não tinha casa de oração, Deus ele próprio era o templo. Lá não é precisa a luz do sol nem da lua: a claridade de Nosso Senhor ilumina-a. 2 Esta «cidade» designa a tua alma espiritual, como diz São Paulo: a alma é um templo de Deus; ela é tão forte, diz Santo Agostinho, que ninguém a pode prejudicar, a não ser que ela se prejudique a si própria por malícia. 3 Notas Este texto é lido na epístola da festa da Dedicação. Reconhece-se, no estilo deste sermão, elementos especificamente eckhartianos que testemunham da sua autenticidade: antíteses, hipérboles, paralelos, comparações e exemplos numerosos. Reconhecemos aqui sobretudo citações escolhidas en

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Em primeiro lugar, é preciso notar a paz que deve estar na alma. É por isso que ela é chamada «Jerusalém». São Dinis diz: «a paz divina penetra, e ordena, e termina, todas as coisas, e se a paz não agisse assim, todas as coisas se diluiriam e não teriam ordem». Em segundo lugar, a paz faz com que as criaturas se derramem, e fluam no amor, e não para prejudicar. Em terceiro lugar, ela torna as criaturas serviçais umas para com as outras, por forma que cada uma seja um sustento para a outra. O que uma delas não consegue ter por si própria, ela recebe-o da outra. É por isso que uma criatura depende da outra. Em quarto lugar, ela faz com que as criaturas se inclinem e regressem para a primeira origem delas, quer dizer para Deus. 1 Notas Ela deve conhecer a paz, é por isso que ela se chama Jerusalém. Tal é a interpretação que Mestre Eckhart já tinha dado, deste nome, no sermão 13, Viu um cordeiro sobre o monte Sião . Esta paz ordena todas as coisas, ela faz com que

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A segunda palavra que ele pronuncia, é que a cidade é «santa». São Dioniso diz que a santidade é toda pureza, liberdade, perfeição. A pureza, é que o ser humano se afaste dos pecados, o que torna a alma livre. A similitude é, no reino celeste, a felicidade, a alegria maior, e se Deus viesse à alma, e se ela não lhe fosse sensível, ela sentiria um tormento, porque São João diz: «aquele que peca é um escravo do pecado». Dos anjos e dos santos, nós podemos dizer que eles são perfeitos, mas dos santos não absolutamente, porque eles têm ainda amor aos seus corpos que repousam ainda na poeira, mas em Deus só está a perfeição total. 1 Eu ficaria surpreendido se, sem ter contemplado em espírito, São João tivesse alguma vez ousado dizer que há três Pessoas, e como o Pai se dispersa com toda a sua perfeição na geração, quer dizer, no Filho, e com a sua bondade no derrame de amor, quer dizer no Espírito Santo. 1 Notas «A cidade é santa», diz São João. Para Dioniso, «santidade»

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Em segundo lugar, «santidade» significa «aquilo que está subtraído à terra». Deus é «qualquer coisa» e um ser puro, e o pecado é nada e afasta de Deus. Deus criou os anjos e a alma a partir de «qualquer coisa», quer dizer, a partir de Deus. A alma é criada, por assim dizer, como que sob a sombra do anjo, no entanto ela e ele têm a mesma natureza, e todas as coisas materiais são criadas do nada e longe de Deus. 1 É por isso que, quando a alma flui para dentro do corpo, ela fica obscurecida e deve ser levada para o alto com o corpo, para Deus. Quando a alma é desobstruída das coisas criadas, ela é «santa». Zaqueu, enquanto estava no chão, não conseguia ver Nosso Senhor. Santo Agostinho diz: «Se o ser humano se quer tornar puro, que ele deixe as coisas terrestres». Eu aliás já o disse frequentemente: a alma não se pode tornar pura a menos que ela retorne à sua pureza primeira, tal qual Deus a criou. Da mesma forma que não se pode fazer ouro com cobre se não o fundirmos

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Em terceiro lugar, ele diz que esta cidade é «nova». É novo aquilo que não é exercido ou que está próximo do seu começo. Deus é o nosso começo. Quando nós estamos unidos a Ele, nós tornamo-nos «novos». Certas pessoas imaginam tolamente que Deus fez ou guardou eternamente nele próprio as coisas que nós vemos agora e que Ele projeta no tempo, mas nós devemos considerar as obras divinas como sendo expontâneas (fora do tempo) assim como eu vos vou dizer. Eu agora estou aqui, e se eu estivesse estado aqui há trinta anos, e se o meu rosto estivesse descoberto, e se ninguém o tivesse visto, no entanto eu teria estado aqui. Se tivessem preparado um espelho e o tivessem colocado diante de mim, o meu rosto projetar-se-ia nele e desenhar-se-ia nele sem esforço da minha parte, e se isso se tivesse produzido ontem, seria novo, e hoje também, seria também mais novo, e assim daqui por trinta anos ou eternamente, seria eternamente novo; e se existissem mil espelhos, isso produzir-se-ia s

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Quando o corpo está pronto, Deus transfunde nele a alma, e ele forma-a segundo o corpo; ela tem uma semelhança com ele e, por causa dessa semelhança, tem amor por ele. É por isso que não há ninguém que não se ame a si próprio; aqueles que imaginam que não se amam a eles próprios, enganam-se a eles próprios, teriam que se odiar e não poderiam subsistir. Nós devemos verdadeiramente amar as coisas que nos conduzem a Deus; não há amor sem o amor de Deus. Se eu tenho o desejo de atravessar o mar, e se eu quero um barco unicamente para viajar sobre o mar, quando eu o tiver atravessado, eu não tenho mais necessidade do barco. Platão diz: o que é Deus, eu não sei – ele quer dizer: todo o tempo que a alma está encerrada no corpo, ela não pode conhecer Deus -, mas aquilo que Ele não é, eu sei-o bem, como se pode notar pelo sol do qual ninguém pode suportar o brilho se ele antes não foi absorvido pelo ar e assim difundido sobre a terra. São Dioniso diz: «Quando a luz divina brilha em

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Ele diz também: a luz divina aparece a cinco tipos de pessoas. As primeiras não a acolhem. Elas são como os animais, inaptos para a acolherem, como se pode notar por uma comparação: se eu me aproximasse de uma água que esteja agitada ou turva, eu não poderia aí ver o meu rosto porque ela não estaria plana. Às segundas , um pouco de luz aparece como a faísca de uma espada numa forja. As terceiras recebem mais dela, como um relâmpago luminoso que rapidamente se extingue; são todas aquelas que recaem da luz divina no pecado. As quartas recebem ainda mais dela, mas por vezes Deus retira-se sem outra razão que a de as estimular e de amplificar o desejo delas. É certo: se alguém quisesse encher o avental de cada um de nós, cada um de nós avançaria o seu avental para poder receber muito. Agostinho diz: «Que aquele que quer receber muito, amplifique o seu desejo.» As quintas recebem uma grande luz, como em pleno dia, e no entanto ela só é produzida por uma fenda. A alma f

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Um mestre diz: aquele que quer conhecer Deus, e não está ornamentado com obras divinas, é rejeitado para o mal. Mas não existe um meio para que se conheça perfeitamente Deus? – Sim, a alma fala nisso no Livro do Amor : «O meu bem amado viu-me por uma janela» - quer dizer sem obstáculos - «e eu vi-o, ele estava perto da parede» - quer dizer perto do corpo que é perecível – e ele diz: «abre-me, minha amiga!» - quer dizer ela é absolutamente minha no amor, porque «ele é meu e eu sou dele»; «minha pomba» - quer dizer simples no desejo -, «minha bela» - quer dizer nas obras - «levanta-te depressa e vem para mim! A frieza passou», pela qual todas as coisas morrem, e igualmente todas as coisas revivem no calor. «A chuva cessou» - é a voluptuosidade das coisas efémeras. «As flores abriram no nosso país»: as flores são o fruto da vida eterna. «Foge, vento do norte!» que secas – com isto, Deus ordena à tentação para não fazer mais obstáculo à alma. «Vem, vento do sul e sopra atravé

Mestre Eckhart – Maria estava em pé junto ao túmulo e chorava

O amor fez com que ela estivesse em pé, o sofrimento fez com que ela chorasse Se a alma soubesse quando Deus penetra nela, ela morreria de alegria, e se ela soubesse quando Ele a deixa, ela morreria de dor Maria procurava Deus só, é por isso que ela o encontrou, e ela não desejava nada mais do que Deus Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Maria estava em pé junto ao túmulo e chorava

Maria estava em pé junto ao túmulo e chorava 1

Sermão 56 - Maria estava em pé junto ao túmulo e chorava Maria estava em pé junto ao túmulo e chorava. (Jo 20, 11) É uma maravilha que ela tenha podido chorar, tanto ela estava triste. O amor fez com que ela estivesse em pé, o sofrimento fez com que ela chorasse. Então ela avançou e olhou para dentro do túmulo. Ela procurava um homem morto e encontrou dois anjos vivos. Orígenes diz: Ela estava em pé. Porque é que ela estava em pé quando os apóstolos tinham fugido? - Ela não tinha nada a perder, tudo aquilo que ela possuía, ela tinha perdido com ele. Quando ele morreu, ela morreu com ele. Quando o enterraram, enterraram a sua alma com ele. É por isso que ela não tinha nada a perder. 1 Notas Nós reencontramos neste fragmento alguns dos temas encontrados no sermão precedente, em relação direta com o texto do Pseudo-Orígenes. Mas enquanto que antes o pregador se tinha limitado, como o «mestre» no qual ele se inspirou, ao comentário do acontecimento evangél

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Ela avançou, então ela encontrou-o. Ela pensou que era um jardineiro, e disse: «Onde é que tu o puseste?» Ela estava de tal forma preocupada com ele que ela só fixou uma das suas palavras 1 : «Onde é que tu o puseste?» Foi o que ela lhe disse. Em seguida ele revelou-se, pouco a pouco, a ela. Se ele se tivesse revelado rapidamente a ela, quando ela sentia um tal desejo, ela teria morrido de alegria. Se a alma soubesse quando Deus penetra nela, ela morreria de alegria, e se ela soubesse quando Ele a deixa, ela morreria de dor. Ela não sabe, nem quando Ele vem, nem quando Ele vai; sem dúvida ela pressente quando Ele está junto dela. Um mestre diz: A sua vinda e a sua partida estão escondidas. A sua presença não está escondida, porque é uma luz, e a natureza da luz é a de se manifestar. 2 Notas Texto defeituoso. [  ↑  ] Se Cristo se tivesse revelado a Maria Madalena rapidamente, ela teria morrido de alegria. Seria o mesmo para a alma se ela soubesse quando Deus

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Maria procurava Deus só, é por isso que ela o encontrou, e ela não desejava nada mais do que Deus. Para a alma que procura Deus, todas as criaturas devem ser um tormento. É para ela um tormento ver os anjos. Igualmente, para a alma que procura Deus, todas as coisas devem ser como um nada. Para que a alma encontre Deus, ela deve possuir seis coisas. A primeira, é que aquilo que lhe parecia suave anteriormente se lhe torne amargo. A segunda, é que, em casa dela, a alma se sinta num espaço apertado, por forma que ela não possa permanecer em casa dela. A terceira, é que ela não deseja nada de Deus. A quarta, é que ninguém outro para além de Deus a possa consolar. A quinta, é que ela não regresse às coisas fugitivas. A sexta, é que ela não tenha repouso interior antes que Ele lhe seja entregue. 1 Rezemos... 2 Notas Maria Madalena só procurava Deus, foi por isso que ela o encontrou. Assim como foi para ela um tormento ver dois anjos em vez daquele que ela pro

Mestre Eckhart – Maria Madalena foi ao túmulo

Maria Madalena foi ao túmulo e procurou Nosso Senhor Jesus Cristo Ela tinha a esperança de que qualquer coisa de Deus tivesse ficado dentro do túmulo Quanto mais o ser humano está mergulhado no fundo da verdadeira humildade, mais ele está mergulhado no fundo do ser divino Se ela amou o teu corpo, ela sabia muito bem que a Divindade estava presente nele É próprio de Deus que nada seja semelhante a Ele Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Maria Madalena foi ao túmulo

Mestre Eckhart – Maria Madalena foi ao túmulo 1

Sermão 55 - Maria Madalena foi ao túmulo Maria Madalena foi ao túmulo e procurou Nosso Senhor Jesus Cristo, ela avançou e olhou para o interior. Ela viu dois anjos junto do túmulo e eles disseram: «Mulher, que procuras tu? - Jesus de Nazaré. - Ele ressuscitou, ele não está aqui.» E ela calou-se e não lhes respondeu. Ela olhou para trás, e para diante, e por cima do seu ombro, e viu Jesus e ele disse: «Mulher, que procuras tu? - Ó Senhor, se tu o levaste, mostra-me onde tu o puseste; eu quero levá-lo.» E ele disse: «Maria!» E porque ela tinha escutado frequentemente esta palavra ternamente dita por ele, ela reconheceu-o, caiu aos seus pés e quis tocá-lo. Ele deu um passo atrás e disse: «Não me toques! Eu ainda não fui para o meu Pai.» (Jo 20, Mc 16) 1 Notas Este texto é retirado do evangelho da Sexta Feira Santa. Noutros locais também, Eckhart comentou estas diferentes passagens de João e de Marco sobre o mesmo assunto, nomeadamente no seu Comentário sobre São João .

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Porque diz ele: «Eu ainda não fui ao meu Pai»? No entanto ele nunca deixou o Pai. Ele queria dizer: «Eu ainda não verdadeiramente ressuscitei em ti.» Porque é que ela diz: «Mostra-me para onde é que tu o levaste, eu quero ir buscá-lo»? Se ele o tivesse levado para a casa do juiz, ela também teria lá ido buscá-lo? Sim, diz um mestre, ela teria ido buscá-lo ao castelo do juiz. Ora poder-se-ia perguntar porque é que ela se aproximou tanto dele apesar dela ser uma mulher, e que aqueles que eram homens - um que amava Deus (Pedro), o outro que era amado por Deus (João) - tinham medo? E o mesmo mestre diz: «A razão é que ela não tinha nada a perder, porque ela era dele e, sendo dele, ela não tinha medo.» 1 Como se eu tivesse dado a minha capa a um qualquer e que um outro lha quisesse tirar, eu não podia impedi-lo porque ela pertenceria ao primeiro, assim como eu o disse frequentemente. 2 Ela não tinha medo por três razões. A primeira, é porque ela era dele. A segunda,

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Ora poder-se-ia perguntar porque é que ela estava em pé e não sentada. Ela estaria no entanto tão próxima dele sentada como em pé. Certos pensam que eles estavam afastados num campo vasto e plano onde nada fazia obstáculo à vista deles, eles veriam igualmente longe quer sentados quer em pé. Mas o que quer que eles pensem, não é assim. Maria estava em pé afim de ver tão longe quanto possível em volta dela se Deus não estava escondido sob qualquer sarça onde ela o iria procurar. A segunda razão: ela estava nela própria de tal forma estendida para Deus com todas as suas potências quanto ela o estava também exteriormente. A terceira razão: ela estava de tal forma submergida pelo sofrimento. 1 Acontece que certos, quando morre o seu querido superior, sejam de tal forma submergidos pelo sofrimento que eles não se conseguem aguentar em pé e têm que permanecer sentados. Mas como o seu sofrimento tinha Deus por causa e o seu fervor por base, não era necessário para ela. 2 A

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Um mestre diz: Senhor, qual é a tua intenção ao te afastares tanto tempo desta mulher, de que é que ela se fez culpada, ou o que é que ela fez? Depois daquela vez em que tu lhe perdoaste os seus pecados, ela não fez nada mais do que amar-te. Se ela cometeu alguma falta, perdoa-lha na tua bondade. Se ela amou o teu corpo, ela sabia muito bem que a Divindade estava presente nele. Senhor, eu apelo à tua verdade divina: tu disseste que tu não te afastarias nunca dela. Tu tens razão porque tu nunca saíste do coração dela, e tu disseste que aquele que te ama, tu o amarias de volta, e que àquele que se levanta cedo, tu aparecerias. Ora São Jorge diz: Se Deus fosse mortal, e se Ele se tivesse afastado tanto tempo dela, o coração dela ter-se-ia completamente despedaçado. 1 Notas Depois da digressão anterior, Eckhart regressa a Maria Madalena. Seguindo sempre o Pseudo-Orígenes, ele interpela diretamente Cristo: porque é que ele se comporta tão duramente com relação a esta

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Ora pode-se também perguntar porque é que ela não viu Nosso Senhor apesar de ele estar tão perto dela? Pode acontecer que os seus olhos tenham sido obscurecidos pelas lágrimas, por forma que ela não o pudesse ver imediatamente. Talvez também que o amor a tivesse cegado, e que ela não acreditasse que ele estivesse tão próximo dela. Terceira razão: ela olhava constantemente para mais longe do que ele estava dela, era por isso que ela não o via. Ela procurava um único corpo morto, e encontrou dois anjos vivos. «Anjo» quer dizer «mensageiro», e «mensageiro»: aquele que é enviado. Ora nós encontramos bem que o Filho é enviado, e que o Espírito Santo também é enviado, mas eles são idênticos; é próprio de Deus, diz um mestre, que nada seja semelhante a Ele. Ela procurava o que era semelhante, e encontrou a dissemelhança: um anjo estava à cabeça, o outro aos pés. Este mestre diz: é próprio de Deus ser um. Porque ela procurava um e encontrou dois, ela não podia ser consolad