Mestre Eckhart – Feliz o ventre que te trouxe 6
- Eis que vocês acabaram de escutar como foi que a nobre alma de Nosso Senhor Jesus Cristo se tornou fecunda na sua santa humanidade.
- Ora vocês devem para alem disso ainda notar agora como é que o ser humano também deve aí chegar.
- Esse ser humano que quer lançar a sua alma, o grão de milho, no campo da humanidade de Jesus Cristo, afim de que ela aí pereça, e se torne fecunda, deve-se corromper também segundo dois modos.
- Um deve ser corporal, o outro espiritual.
- Deve-se compreender assim o modo corporal: o que quer que ele sofra quanto à fome, à sede, o desprezo e muitos sofrimentos imerecidos, de qualquer maneira que Deus lho inflija, ele deve acolhê-lo de bom grado e alegremente, tal como se Deus só o tivesse criado para o sofrimento, as vicissitudes e a pena, e ele não deve aí procurar e desejar em nada o seu bem próprio, nem no céu nem sobre a terra, e todo o seu sofrimento lhe deve parecer bem mínimo, tal como uma gota de água em relação com o mar encapelado.
- Também mínimo te deve parecer todo o teu sofrimento, comparado ao grande sofrimento de Jesus Cristo.
- Assim, o grão de milho, a tua alma, torna-se fecundo no nobre campo da humanidade de Jesus Cristo, e aí perece de tal forma que renuncia totalmente a si próprio.
- Tal é o primeiro modo da fecundidade do grão de milho caído no campo e na terra da humanidade de Jesus Cristo.
- Notem o segundo modo de fecundidade do espírito, do grão de milho!
- É toda a fome e a amargura espirituais nas quais Deus o faz cair; ele deve suportar tudo isso pacientemente; mesmo quando ele faz tudo o que ele pode, interiormente e exteriormente, ele não deve esperar nada em retorno.
- E se Deus o quisesse aniquilar ou lançar no inferno, ele não deve querer, nem desejar, que Deus o mantenha no seu ser ou que Ele o preserve do inferno, mas ele deve deixar Deus fazer dele aquilo que Ele quer, ou como se ele não existisse.
- Deus deve ter tanto poder sobre tudo aquilo que tu és, como sobre a sua própria natureza incriada.
- Tu deves ter outra coisa ainda.
- Eis: se Deus te tirasse a tua pobreza interior, te cumulasse de riqueza interior, e de graça, e te unisse a Ele próprio numa altura tão grande que a tua alma pudesse suportar, que então tu te consideres destituído dessa riqueza e dês a Deus apenas a honra, como quando a tua alma estava destituída quando Deus fez dela qualquer coisa a partir de nada.
- Tal é o outro modo da fecundidade que o grão de milho, a tua alma, recebeu da terra que é a humanidade de Jesus Cristo que, em toda a nobreza da sua fruição, permanecia desprendido como ele próprio diz aos fariseus: «Se eu procurasse a minha honra, a minha honra não seria nada. Eu procuro a honra do meu Pai que me enviou.» 1
Notas
- Como nele, o grão de milho da alma humana deve ser lançado ao campo da humanidade de Cristo, para que essa alma pereça como a sua, e produza também fruto no cêntuplo.
Segundo dois modos: primeiro dando-se plenamente a Deus, quer dizer aceitando de bom grado todas os sofrimentos que Deus lhe quer enviar. Eles devem-lhe parecer mínimos, comparados com os de Cristo.
Espiritualmente também, aceitando a fome e a amargura da alma, a sua aniquilação ou a sua danação se Deus quisesse assim. «Deus deve ter tanto poder sobre tudo aquilo que tu és, como sobre a sua própria natureza incriada.»
E se Deus quiser conceder-te uma grande riqueza interior, que tu te consideres como destituído dessa riqueza, e prestes honra a Deus apenas. [ ↑ ]
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