Nuvem de Desconhecimento – Capítulo 57



Como tais jovens discípulos presunçosos compreendem mal e desprezam a expressão «para o alto», e das ilusões e erros que daí advêm.
  1. Nada mais sobre isto quanto ao presente, mas avancemos na nossa matéria: como esses jovens discípulos espirituais presunçosos desentendem essa outra expressão «para o alto».
  2. Porque se acontece que eles próprios leram, ou ouviram ler ou dizer que os seres humanos deveriam elevar os seus corações para Deus, imediatamente eis que eles elevam os olhos para as estrelas como se eles quisessem ir para além da lua, e que esticam as orelhas como se eles fossem ouvir um anjo do céu pôr-se a cantar. Esses seres humanos, na curiosidade da sua imaginação, vão em breve penetrar nos planetas e fazer um furo no firmamento, para o observar dessa forma. Eles vão fazer por eles próprios um Deus à conveniência deles, que eles vão vestir com ricas roupas e sentar sobre um trono também mais sumptuoso do que tudo o que alguma vez foi pintado sobre a terra. Eles vão imaginar os anjos com figura corporal, e fazer de cada um um menestrel com instrumentos mais estranhos e mais diversos do que tudo o que alguma vez foi visto ou ouvido aqui em baixo. E o diabo enganará e iludirá alguns muito maravilhosamente.
  3. Porque ele lhes enviará uma espécie de orvalho, alimento dos anjos pensarão eles, enquanto que ele descerá do céu e cairá suavemente e deliciosamente na boca deles; e é por isso que eles ganharam o hábito de ficarem sentados com a boca escancarada como se eles quisessem apanhar uma mosca. E isso, no entanto, tudo isso que não passa de uma ilusão não lhes parece ser senão mais santo; mas eles têm a alma perfeitamente vazia, durante esse tempo todo, de qualquer verdadeira devoção. Eles só têm vaidade e mentira no coração, por culpa do estranho trabalho da sua curiosidade.
  4. E ainda muito frequentemente o diabo lhes simulará sons insólitos nas suas orelhas, luzes e clarões maravilhosas nos seus olhos, requintados perfumes nos seus narizes: e tudo isso não passa de falsidade. Mas eles não crêem nisso (que seja falsidade) de maneira nenhuma, pensando encontrar o exemplo deles, para olharem assim para o alto e se aplicarem dessa forma, em são Martinho que viu Deus, por revelação, no meio dos Seus anjos, envolvido no seu manto, ou ainda de santo Estêvão, o qual viu nosso Senhor em pé no céu, e de tantos outros; e ainda de Cristo, o qual ascendeu em corpo ao céu, à vista dos Seus discípulos. Também dizem eles que nós devemos ter os olhos elevados assim lá do outro lado (no céu), para o alto.
  5. Eu admito e concedo bem que no comportamento do corpo, nós devêssemos levantar para o alto quer os olhos quer as mãos se nós somos chamados a isso em espírito. Mas eu afirmo que a obra do nosso espírito não tem de maneira nenhuma que ser dirigida para o alto ou para baixo, nem de um lado nem do outro, nem para diante nem para trás, como acontece quando se trata do corpo. Porquê? Porque a nossa obra deve ser espiritual e não corporal, nem corporalmente gerada.


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