Nuvem de Desconhecimento – Capítulo 54



Como é que, pela virtude desta obra, um ser humano é governado na plena sabedoria. E ele se torna perfeitamente decente tanto de corpo como de alma.
  1. Quem quer que seja que esteja nesta obra, ele deverá nela ser tido e governado na perfeita decência, tanto no seu corpo como na sua alma; e por todos aqueles que o vêem, ele deverá por isso ser simpaticamente considerado. Se efetivamente o homem ou a mulher menos favorecidos nesse ponto de vista, se eles viessem para esta vida para trabalharem nesta obra, a consideração por eles muito subitamente e graciosamente se encontraria mudada, de tal forma que todos os seres humanos de bem, encontrando-os, se sentiriam felizes e alegres com a companhia deles, e mais, considerariam com a presença desses que eles eram ajudados e assistidos pela graça para se voltarem para Deus.
  2. E é por isso que esse dom é obtido por aquele que pode, pela graça, tê-lo: porque quem quer que o possui autenticamente e que o tem na verdade, esse saberá e poderá governar-se e conduzir-se pela virtude aí associada, e não apenas para si próprio mas também para tudo o que depende dele. Nenhuma natureza, e nenhuma disposição, escapará à sua prudência. E muito bem saberá ele fazer-se semelhante aos seus semelhantes, quer estes sejam pecadores inveterados ou não, sem ter nele próprio nenhum pecado; e todos os que o virem ficarão espantados, e, com a assistência da graça, ele levará outros a trabalharem e a operarem no próprio espírito em que ele próprio opera.
  3. As palavras dele e os encorajamentos dele ficarão impregnados de sabedoria espiritual, e pronunciados com fogo e com fruto numa sóbria firmeza e numa muito suave segurança, sem nenhuma das afetações e dos empoamentos dos hipócritas. Porque há os que, com todas as suas forças interiores e exteriores, empalham os seus discursos, imaginam que se preservam de todo o tipo de quedas por intermédio das numerosas palavras humildemente empoadas e dos gestos de aparente devoção: os quais se preocupam mais em parecerem santos aos olhos dos seres humanos do que de o serem efetivamente aos olhos de Deus e dos Seus anjos. Porque essas gentes, elas afetam-se muito mais e atribuem uma importância muito maior a um certo gesto ou palavra que choca e que parece incongruente aos humanos, do que a mil vãos pensamentos e fedorentas intenções de pecado que elas aceitam ter nelas e que elas suportam com indiferença ao exibirem-nas à vista de Deus, dos santos e dos anjos do céu. Ah! Senhor Deus! é realmente onde se encontra interiormente o orgulho, que se encontram exteriormente em igual abundância as palavras humildes e empoadas! Mas o que assenta e convém, eu te asseguro, àqueles que são humildes por dentro, é que a humildade e a decência dos gesto e das palavra, por fora, estejam de acordo com a humildade que eles têm no fundo do coração, – e eles não têm necessidade de que ela se exprima em vozes quebradas ou empoadas, contra as disposições da natureza e do caráter que eles têm. Porque, se eles são verdadeiros, eles falam com toda a firmeza e a amplitude da voz e do espírito que estão neles. E quem possui, por natureza, uma voz grossa e brutalmente brilhante, se ele fala por cochichos e por empoamentos – a menos que, evidentemente, ele esteja doente, ou de outra forma que seja entre ele e o seu Deus, ou entre ele e o seu confessor – então ele dá aí um verdadeiro sinal de hipocrisia. E eu entendo bem aqui a hipocrisia idosa, assim como a hipocrisia jovem.
  4. O que direi eu mais, sobre essas ilusões e enganos venenosos e envenenados? Eu creio e penso verdadeiramente que por falta, com a (ajuda da) graça (de Deus), de abandonar e de deixar esses cochichares e esses empoamentos hipócritas, que são secretamente enterrados no íntimo do coração, no meio do orgulho de toda a humildade exterior das palavras, a alma perdida arrisca e vai muito em breve soçobrar na aflição e no desespero.


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