Nuvem de Desconhecimento – Capítulo 40



Que no tempo desta obra, a alma não dá nenhuma atenção nem consideração particular a nenhum vício em si própria e nenhuma virtude em si própria.
  1. E tu, faz igualmente, que o teu espírito esteja todo cheio da significação espiritual dessa palavra «falta», e sem consideração mais particular a nenhum tipo de pecado que seja, pecado venial ou pecado mortal: Orgulho, Cólera ou Inveja, Cobiça, Preguiça, Gula ou Luxúria. Tanto faz ao contemplativo que seja tal pecado ou tal outro, ou de qual gravidade que ele seja. Porque todos os pecados, ele os vê – eu quero dizer, durante o tempo desta obra – igualmente graves neles próprios, pelo facto de que o mínimo pecado o separa de Deus e o cerceia da sua paz espiritual.
  2. E que tu tenhas o sentimento dessa «falta» ou pecado como se ele fosse um bloco maciço e que tu nunca sabes o que é, a não ser que és tu próprio. E grita então sem cessar em espírito essa única «Falta! falta! falta! Ai! ai! ai!». O qual grito espiritual, tu aprenderás bem melhor de Deus por experiência, que pela palavra de nenhum ser humano qualquer que ele seja. Porque o melhor é este grito em toda a pureza do espírito, sem nenhum pensamento particular nem enunciado de nenhuma palavra; a menos no entanto, o que acontece em raros momentos, que por excesso e abundância, o espírito estoire subitamente em palavras, o corpo e a alma estando todos os dois cheios e oprimidos pela mágoa e pelo impedimento do pecado.
  3. E da mesma maneira farás tu dessa pequena palavra de «Deus»: que o teu espírito esteja todo cheio do seu significado espiritual, e sem nenhuma consideração mais particular por nenhuma das Suas obras, corporal ou espiritual, tão boa, ou melhor, ou excelente que ela seja – nem tão pouco por nenhuma virtude, que possa suscitar na alma humana qualquer graça que seja; e de forma nenhuma tu procurarás ver se é Humildade ou Caridade, Paciência ou Abstinência, Esperança, Fé ou Temperança, Caridade ou Pobreza voluntária. O que interessa isso ao contemplativo? Porque em todas as virtude ele encontra e vê, reconhece e tem o sentimento de Deus; porque n'Ele estão todas as coisas, todas em conjunto por causa e por estado. É por isso que os contemplativos pensam que se eles têm Deus, eles têm e possuem todo o bem, e por conseguinte eles não cobiçam nada por consideração mais particular, nada senão o único bem: Deus. E tu, faz igualmente também tão longe quanto possas pela graça: e ouve Deus em tudo, e em tudo Deus, afim de que não haja obra no teu espírito e na tua vontade senão Deus apenas.
  4. Mas porque tal, e igualmente por muito tempo que tu vivas nesta vida miserável, é o teu quinhão de sempre ter em qualquer parte o sentimento dessa horrível e fedorenta massa do pecado, tal como se ela estivesse unida e fundida com a substância do teu ser, então e é por isso que tu pensarás alternadamente e tomarás as duas palavras: «Falta» e «Deus», tendo esse conhecimento geral de que se tu tens Deus, então tu serás corrigido do pecado; e se tu te podes corrigir do pecado, então tu possuirás Deus.


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