Mestre Eckhart – Ave, cheia de graça 5


  1. O maior bem que Deus alguma vez concedeu ao ser humano, foi ter-se feito homem.
  2. Eu vou-vos contar uma história que convém bem aqui.
  3. Havia um homem rico e uma mulher rica.
  4. A mulher teve um acidente, ela perdeu um olho.
  5. Ela ficou muito aflita.
  6. O homem veio ter com ela e disse: «Senhora, porque estás tão aflita? Não deves estar aflita porque perdeste o teu olho.»
  7. Ela disse: «Senhor, eu não estou aflita por ter perdido o meu olho; eu estou aflita porque me parece que tu me amas menos.»
  8. Ele disse então: «Senhora, eu amo-te.»
  9. Pouco depois ele arrancou a ele próprio um olho, veio ter com a mulher e disse: «Senhora, afim de que tu acredites que eu te amo, tornei-me semelhante a ti; eu também, já só tenho um olho.»
  10. Da mesma forma o ser humano: com dificuldade acreditava que Deus o amava tanto até que finalmente Deus «arrancou a ele próprio um olho» e assumiu a natureza humana. Quer dizer que ele se «fez carne».
  11. Nossa Senhora disse: «Como é que isso vai ser feito?»
  12. O anjo disse: «O Espírito Santo descerá desde o alto em ti», desde o trono mais elevado do Pai da luz eterna. 1

Notas
  1. O mais prodigioso bem que Deus fez ao ser humano foi ter-se incarnado.

    Segue-se a encantadora história que faz passar através dos pensamentos de uma tão alta espiritualidade um sopro muito humano de poesia cortês.

    Eckhart não imaginou todas as partes, mas quem, no seu auditório, sabe que ela é devida a Herrand de Wildonia que viveu no século precedente?

    O papel das personagens aliás está invertido: foi a mulher quem se mutilou para provar o seu amor ao seu cavaleiro.

    Em Eckhart, é o esposo que realiza o sacrifício em homenagem à sua Senhora.

    A alegoria é transparente: trata-se de Cristo e da alma.

    A história agradou tanto a Mestre Eckhart que a retomou no seu comentário sobre S. João.

    Nicolau de Cusa, por seu turno, inspirou-se nela num sermão. [  ]


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