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A mostrar mensagens de julho, 2010

Livro da Vida Perfeita - Não há impassibilidade nesta vida

« O ser humano pode e deve, desde esta vida, tornar-se tão impassível como o foi Cristo depois da sua Ressurreição. » Eis o que se diz e o que se ouve. Quis-se confirmá-lo e prová-lo pelas palavras de Cristo: « Eu vos precederei na Galileia. É lá que vocês me verão. » (Mt 26, 32) e « Um espírito não tem nem carne nem osso como vocês vêem que eu tenho » (Lc 24, 39). Quis-se interpretar estas palavras como se segue: «Como vocês me viram e seguiram com um corpo e uma vida mortais, vocês ver-me-ão: eu vos precederei e vocês me seguirão na Galileia - quer dizer vocês me seguirão numa impassibilidade e numa imobilidade que vocês sentirão e saborearão, na qual vocês viverão e permanecerão antes mesmo de atravessarem e de sofrerem a morte corporal. «Como vocês me vêem com um corpo de carne e de osso e no entanto impassível, vocês tornar-se-ão também impassíveis desde antes da morte corporal, na vossa humanidade corporal e mortal.» A estas afirmações, responder-se-á isto: Cristo não q

Livro da Vida Perfeita - Imobilidade e movimento

Quando a união se fez realmente, a pessoa interior permanece imóvel nessa união. Quanto à pessoa exterior, Deus faz ela ir aqui e acolá, e realizar isto ou aquilo, que é necessário ou indispensável. A pessoa exterior diz então - e é realmente assim na verdade: « Eu não quero ser nem não ser, viver nem morrer, saber nem ignorar, fazer nem não fazer, nem nada de semelhante. Mas eu obedeço a tudo o que deve ser, por necessidade ou por obrigação, quer seja agindo quer sujeitando-me. » A pessoa exterior não tem assim outro objetivo nem outra procura que não seja satisfazer a vontade eterna. Porque é sabido na verdade que a pessoa interior deve permanecer imóvel enquanto que a pessoa exterior deve ter movimento. Se a pessoa interior tem um "porquê" no movimento da pessoa exterior, isso só vem de uma necessidade e de uma obrigação ordenadas pela vontade divina. É assim mesmo quando Deus ele próprio é pessoa, como se vê em Cristo. Quando isto se produz na ou pela luz divi

Imitação de Cristo - 3.5. Dos maravilhosos efeitos do amor divino

Alma: Eu bendigo-vos, Pai celeste, Pai de Jesus Cristo, nosso Senhor, porque vos dignastes recordar de mim, pobre criatura. « Ó Pai das misericórdias e Deus de toda a consolação » (2 Coríntios 1, 3), dou-vos graças porque, indigno como sou, vós me quereis no entanto algumas vezes consolar. Eu bendigo-vos para sempre, e eu glorifico-vos com o vosso Filho único e o Espírito consolador, nos séculos dos séculos. Ó Senhor meu Deus, santo objeto do meu amor! quando vós descerdes no meu coração, todas as minhas entranhas exultarão de alegria. Vós sois a glória e a alegria do meu coração. Vós sois a minha esperança e o meu refúgio no dia da tribulação. Mas porque o meu amor ainda é fraco, e a minha virtude titubeante, eu tenho necessidade de ser fortificado e consolado por vós; visitai-me portanto com frequência, e dirigi-me com as vossas divinas instruções. Livrai-me das más paixões, e retirai do meu coração todas as afeições desregradas, afim de que, curado e purificado inte

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza

«Uma pessoa nobre partiu para um pais distante afim de aí obter um reino, e regressou em seguida» O ser humano tem em si duas naturezas: o corpo e o espírito A pessoa interior Cada ser humano tem um espírito bom, um anjo, e um espírito mau, um demónio A pessoa exterior A semente de Deus está em nós O primeiro grau O segundo grau O terceiro grau O quarto grau O quinto grau O sexto grau A imagem de Deus está no fundo da alma como uma fonte viva O sol brilha sem interrupção, mas quando uma nuvem se interpõe, nós não vemos a sua luz A alma que se volta para baixo recebe daí um véu que a recobre A pessoa deve abandonar todas as imagens e a si própria, afastar-se e tornar-se estrangeira e dissemelhante a tudo Toda a espécie de mediação é estrangeira a Deus «Virgens puras, eu vos confiei e desposei ao Um» Numa pessoa nobre encontra-se unicamente vida pura, ser, verdade e bondade A pessoa nobre é um, e reconhece Deus e a criatura no Um A pessoa nobre contempla Deus sem

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 1

Tratado da Nobreza Nosso Senhor disse no Evangelho: «Uma pessoa nobre partiu para um pais distante afim de aí obter um reino, e regressou em seguida.» 1 Nosso Senhor ensina-nos, com estas palavras, a que ponto o ser humano é criado nobre na sua natureza, a que ponto é divino aquilo que ele pode atingir pela graça, e também como é que ele lá deve chegar. Estas palavras estão também em relação com uma grande parte da Santa Escritura. Notas O ponto de partida do tratado é o versículo de Lucas 19, 12: « Um homem nobre partiu para uma país distante afim de aí obter um reino, e regressou em seguida. » [  ↑  ] [ ◊ ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Tratado da Nobreza 1

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 2

É preciso primeiro saber, e é absolutamente manifesto, que o ser humano tem em si duas naturezas: o corpo e o espírito. É por isso que um texto diz: Aquele que se conhece a si próprio conhece todas as criaturas, porque todas as criaturas são ou corpo ou espírito. É por isso que a Escritura diz do ser humano que há em nós uma pessoa exterior e uma outra: a pessoa interior. 1 À pessoa exterior pertence tudo aquilo que é inerente à alma, envolto em carne e misturado com ela, fazendo obra corporal comum com e dentro de cada membro, como o olho, a orelha, a língua, a mão e outros. E a Escritura chama a isso tudo a pessoa velha, a pessoa terrestre, a pessoa exterior, a pessoa inimiga, uma pessoa escrava. Notas Tal como fez várias vezes nas suas obras latinas e alemãs, Eckhart retoma a definição clássica da "pessoa exterior" e da "pessoa interior". Ele compara esta, a pessoa nobre, à semente que frutificará se o mau cultivador não a sufocar. É a semen

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 3

A outra pessoa que existe em nós é a pessoa interior; a Escritura chama-lhe uma pessoa nova, uma pessoa celeste, uma pessoa jovem, um amigo e uma pessoa nobre. E é nela que pensa Nosso Senhor quando diz que «uma pessoa nobre partiu para um pais distante afim de aí obter um reino, e regressou em seguida». [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Tratado da Nobreza 3

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 4

É preciso ainda saber que São Jerónimo e os mestres em geral, dizem que, desde o início da sua existência humana, cada ser humano tem um espírito bom, um anjo, e um espírito mau, um demónio. O anjo bom convida e incentiva constantemente para o que é bom, para o que é divino, para a virtude, e para o que é celeste e eterno. O espírito mau convida e incentiva sem cessar a pessoa para o que é temporal e efémero, para o que é contrário à virtude, mau e diabólico. Esse mesmo espírito mau relaciona-se constantemente com a pessoa exterior e, por ela, lança sem cessar e em segredo armadilhas à pessoa interior, tal como a serpente se relacionou com a Senhora Eva e por intermédio dela com o homem Adão. A pessoa interior é Adão. O elemento masculino na alma é a árvore boa que sempre e sem cessar dá bons frutos, da qual fala também Nosso Senhor. É também o campo no qual Deus semeou a sua imagem e a sua semelhança e onde ele lança a boa semente, a raiz de toda a sabedoria, de todas a

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 5

A pessoa exterior é a pessoa inimiga, a má, que semeou e lançou o joio. São Paulo disse dele próprio: «Eu encontro em mim aquilo que me entrava, contrário àquilo que Deus ordena, ao que Deus aconselha, ao que Deus disse e diz ainda no mais elevado, no fundo da minha alma». Noutro local, ele diz ainda gemendo: «Ai! Infeliz que eu sou! Quem me libertará desta carne e deste corpo mortal?» Noutro local ainda, ele diz que o espírito do ser humano e a carne estão constantemente opostas uma ao outro. A carne aconselha o vício e a malícia; o espírito aconselha o amor de Deus, a alegria, a paz, e todas as virtudes. Àquele que segue o espírito, que vive segundo o espírito e o seu conselho, pertence a vida eterna. A pessoa interior é aquela de quem Nosso Senhor diz que «uma pessoa nobre partiu para um pais distante afim de aí obter um reino». É a árvore boa, da qual Nosso Senhor diz que ela dá sempre bons frutos e nunca maus, porque ela quer a Bondade, inclina para a Bondade, par

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 6

Da nobreza da pessoa interior e da indignidade da pessoa exterior, da carne, os mestres pagãos Cícero e Séneca dizem também que nenhuma alma racional existe sem Deus; a semente de Deus está em nós. Se ela tivesse um cultivador bom e sábio, laborioso, ela tanto melhor prosperaria e elevar-se-ia para Deus do qual ela é a semente, e o fruto seria semelhante à natureza de Deus. A semente da pereira cresce para se tornar numa pereira, a semente da nogueira para se torna nogueira, a semente de Deus para se tornar Deus. Mas se a boa semente tem um cultivador insensato e mau, o joio cresce, cobre e sufoca a boa semente, de forma que ela não pode chegar à luz nem se desenvolver. Orígenes, um grande mestre, disse: Visto que Deus ele próprio semeou, enterrou, gerou esta semente, ela pode bem ser coberta e escondida, ela não é nunca aniquilada nem extinta; ela é ardente, ela brilha, ela ilumina e queima e tende sem cessar para Deus. [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ]

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 7

O primeiro grau da pessoa interior, da pessoa nova, disse Santo Agostinho, é quando a pessoa vive segundo o modelo das pessoas boas e santas, mas ela apoia-se ainda nas cadeiras, fica perto das paredes e alimenta-se de leite. [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Tratado da Nobreza 7

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 8

O segundo grau, é quando daqui em diante ela não olha mais apenas para os modelos exteriores nem para as pessoas de bem, mas corre à pressa para o ensinamento e o conselho de Deus e da sabedoria divina, volta as costas à humanidade e o seu rosto para Deus, escapa aos joelhos da sua mãe e sorri para o Pai celeste. [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Tratado da Nobreza 8

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 9

O terceiro grau, é quando a pessoa escapa cada vez mais à sua mãe, se afasta sempre daqui em diante dos joelhos dela, foge da preocupação, rejeita o medo, apesar de que, mesmo podendo agir mal e injustamente sem escandalizar ninguém, ela não tem no entanto desejo disso; porque ela está unida a Deus pelo amor e pelo bom zelo, até que Deus a leve e a introduza na alegria, na suavidade e na felicidade onde ela não pode suportar o que é dissemelhante e estrangeiro a Deus. [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Tratado da Nobreza 9

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 10

O quarto grau, é quando ela cresce e se enraíza cada vez mais no amor e em Deus, de tal forma que ela está pronta a aceitar tudo o que é contrariedade, tentação, adversidade, e a suportar sofrer de bom grado e de boa vontade, com desejo e alegria. [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Tratado da Nobreza 10

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 11

O quinto grau, é quando ela vive fechada por todas as partes em si própria, repousando pacificamente na riqueza e na superabundância da suprema e inexprimível Sabedoria. [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Tratado da Nobreza 11

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 12

O sexto grau, é quando a pessoa está desprendida das imagens e transformada acima dela própria pela eternidade de Deus, quando ela chegou ao esquecimento total e perfeito da vida efémera e temporal, transformada numa imagem divina, tornada filha de Deus. Para além deste, não existe grau mais elevado, lá estão o repouso e a felicidade eternas, porque o fim da pessoa interior e da pessoa nova é a vida eterna. 1 Notas Seguindo Santo Agostinho em De vera religione , mas com mais amplitude, no desenvolvimento das imagens, Eckhart indica os seis graus de ascensão da pessoa nobre, as seis etapas que deve percorrer na sua viagem. A pessoa nobre imita primeiro as pessoas devotas, como uma criança que ainda não se aguenta bem em pé, e se alimenta de leite. No segundo grau, ela volta as costas à humanidade e procura a face divina. No terceiro, ela rejeita o medo, e aplica-se às coisas de Deus, unida a ele no amor. Em seguida enraíza-se de tal forma nele que ela está pronta p

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 13

Para esta pessoa interior, esta pessoa nobre, na qual a semente de Deus está impressa e semeada – como é que esta semente, esta imagem da natureza e da essência divinas, o Filho de Deus, aparece, como é que nós a apercebemos, e como é que também de tempos a tempos ela fica escondida – o grande mestre Orígenes apresenta uma comparação: a imagem de Deus, o Filho de Deus está no fundo da alma como uma fonte viva. Mas se deitarem terra por cima dela, quer dizer o desejo terrestre, ela é entravada e coberta, por forma que ela não é mais reconhecida e não é mais vista; no entanto ela permanece viva em si própria, e quando se retira a terra, ela reaparece e bebe-se dela. O mesmo mestre diz que é feita alusão a esta verdade no primeiro livro de Moisés, onde está escrito que Abraão tinha escavado no seu campo poços de água viva, que os malfeitores encheram de terra, mas que em seguida, quando a terra foi retirada, os poços reapareceram vivos. [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguint

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 14

Pode-se fazer também outra comparação. O sol brilha sem interrupção, no entanto, quando uma nuvem ou um nevoeiro se interpõe entre nós e o sol, nós não vemos a sua luz. Da mesma forma, quando a vista é fraca, doente ou velada, não se apercebe da luz. Além disso, por vezes eu apresentei uma comparação impressionante. Quando um mestre faz uma imagem de madeira ou pedra, ele não introduz a imagem na madeira, ele retira as aparas que escondiam e recobriam a imagem; ele não acrescenta nada à madeira, pelo contrário, ele retira e escava aquilo que a recobre, ele retira as escórias; brilha então aquilo que estava escondido por baixo. Tal é o tesouro escondido no campo, como diz Nosso Senhor no Evangelho. [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Tratado da Nobreza 14

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 15

Santo Agostinho disse: «Se a alma se eleva completamente apenas para Deus, a imagem de Deus aparece e brilha, mas se a alma se volta para o exterior, mesmo pelo exercício exterior da virtude, a imagem é completamente recoberta.» É o que ensina São Paulo quando diz que as mulheres trazem a cabeça coberta e os homens a cabeça descoberta. É porque tudo o que, na alma, se volta para baixo, recebe daí um véu que a recobre, mas o que, na alma, se eleva para Deus, é a pura imagem de Deus, o nascimento de Deus sem véu, despojado na alma despojada. 1 Da pessoa nobre, imagem de Deus, filho de Deus, semente da natureza divina que nunca é aniquilada em nós, apesar de poder ser recoberta, o rei David disse no saltério: «Apesar de muitas vaidades, sofrimentos e misérias assaltarem o ser humano, no entanto ele permanece na imagem de Deus, e a imagem de Deus nele». A verdadeira luz brilha nas trevas apesar de não a podermos ver. Notas Eckhart só fala aqui uma vez em termos próprios

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 16

«Não reparem na minha tez escura», diz o Livro do Amor 1 , «eu sou bela e bem feita, mas o sol queimou-me.» O sol é a luz deste mundo, e isto significa que o que é mais elevado e o melhor entre as coisas feitas e criadas, esconde e deteriora a imagem de Deus em nós. «Retirem as escórias da prata», disse Salomão, «então o vaso mais puro vai luzir e brilhar»: a imagem, o Filho de Deus na alma. E é o que quer dizer Nosso Senhor quando fala duma «pessoa nobre que partiu», porque a pessoa deve abandonar todas as imagens e a si própria, afastar-se e tornar-se estrangeira e dissemelhante a tudo, se ela quer e deve verdadeiramente acolher o Filho e tornar-se filho, no seio e no coração do Pai. Notas Cântico dos cânticos. [  ↑  ] [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Tratado da Nobreza 16

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 17

Toda a espécie de mediação é estrangeira a Deus. «Eu sou», disse Deus, «o primeiro e o último». Não existe distinção nem na natureza de Deus nem nas Pessoas segundo a unidade da natureza delas. A natureza divina é Um, e cada Pessoa também é Um e o mesmo Um que é a natureza delas. A distinção entre o ser e a essência é compreendida como Um e é Um. É apenas lá onde esse Um não está mais em si próprio que ele recebe, possui e produz uma distinção. É por isso que no Um se encontra Deus e aquele que quer encontrar Deus deve tornar-se um. «Uma pessoa partiu», disse Nosso Senhor. Na distinção não se encontra nem o Um nem o ser, nem Deus, nem repouso, nem beatitude, nem satisfação. Sê um, afim de que tu possas encontrar Deus. E em verdade, se tu fosses verdadeiramente um, tu permanecerias um também na diversidade e a diversidade tornar-se-ia um para ti e não te poderia entravar absolutamente em nada. O um permanece igualmente um em mil vezes mil pedras tal como em quat

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 18

Um mestre pagão disse que o um nasceu de Deus altíssimo. A sua natureza é de ser um com o Um. Quem o procura abaixo de Deus engana-se a si próprio. E em quarto lugar, diz o mesmo mestre, esse Um não tem amizade mais real que a que tem com as jovens ou virgens, como diz São Paulo: «Virgens puras, eu vos confiei e desposei ao Um». E é assim absolutamente que a pessoa deveria ser, porque Nosso Senhor disse: «Uma pessoa partiu». [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Tratado da Nobreza 18

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 19

"Ser humano", segundo o significado do nome em latim, designa num sentido aquele que se inclina diante de Deus e se submete a ele com tudo aquilo que ele é e tudo aquilo que ele tem, que olha para cima para Deus, não para aquilo que lhe pertence, que ele sabe estar atrás de si, por baixo de si, ao lado de si. Tal é a plena e verdadeira humildade: o ser humano tem este nome a partir da terra. 1 Eu não falarei mais disto. Quando se diz "ser humano", essa palavra significa também qualquer coisa de elevada acima da natureza, acima do tempo, e acima de tudo o que está voltado para o tempo ou o gosto do mundo, e eu digo a mesma coisa também do espaço e da corporalidade. Além disso, este "ser humano" não tem de uma certa maneira nada de comum com o que quer que seja, quer dizer que ele não tem nem forma nem semelhança com isto ou aquilo, e não sabe nada do vazio, de forma que não se encontra e não se percepciona em nenhuma parte dele algo de vazio, e q

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 20

Há ainda um outro modo de explicação e um ensinamento para o que Nosso Senhor chama «uma pessoa nobre». Deve-se saber com efeito que aqueles que conhecem Deus sem véu conhecem as criaturas ao mesmo tempo que ele, porque o conhecimento é uma luz da alma e, por natureza, todas as pessoas aspiram ao conhecimento, porque mesmo o conhecimento das coisas más é bom. Ora os mestres dizem: Quando se conhece a criatura em si própria, isso é um conhecimento "vespertino", porque assim vê-se as criaturas por imagens com uma multidão de distinções, mas quando se conhece as criaturas em Deus, esse conhecimento chama-se e é um conhecimento "matutino" e assim contempla-se as criaturas sem nenhuma distinção, desapropriadas de toda imagem e despojadas de toda semelhança no Um que Deus é ele próprio. 1 Isto é também a «pessoa nobre» de quem Nosso Senhor disse: «Uma pessoa nobre» partiu: nobre porque ela é um, e reconhece Deus e a criatura no Um. Notas Suso retomou est

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 21

Eu quero agora passar a outro significado daquilo que é a «pessoa nobre». Eu digo: quando a pessoa, a alma, o espírito contempla Deus, ele sabe-se e reconhece-se também como conhecedor, quer dizer: ele reconhece que contempla e reconhece Deus. Ora, pareceu a certos e parece também muito verosímil, que a flor e o núcleo da beatitude se situam no conhecimento pelo qual o espírito conhece que ele conhece Deus, porque se eu possuísse todas as delícias sem saber nada acerca delas, que me importaria, e que delícias seriam elas para mim? Portanto eu digo com segurança que não é assim. Se é verdade que, sem isso, a alma não seria bem-aventurada, a beatitude não se situa no entanto aí, porque o primeiro elemento da beatitude é que a alma contemple Deus sem véu. É daí que ela recebe todo o seu ser e a sua vida e que ela obtém tudo o que ela é no abismo de Deus e não sabe nada do conhecimento nem do amor nem do que quer que seja. Ela repousa totalmente e exclusivamente no ser de De

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 22

Os mestres dizem que o poder graças ao qual o olho vê é diferente do poder pelo qual ele reconhece aquilo que ele vê. O facto de ver, ele tira-o exclusivamente da cor, não daquilo que é colorido. Donde importa pouco que o que é colorido seja pedra ou madeira, uma pessoa ou um anjo, o essencial reside unicamente no facto de que ele tem uma cor. [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Tratado da Nobreza 22

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 23

Da mesma forma, eu digo que a pessoa nobre pega e toma todo o seu ser, a sua vida e a sua beatitude unicamente de Deus, junto de Deus e em Deus, não do conhecimento, da contemplação e do amor de Deus ou de outras coisas semelhantes. É por isso que Nosso Senhor diz muito certamente que a vida eterna consiste em conhecer apenas Deus como sendo o único verdadeiro Deus, não em conhecer que se conhece Deus. Como é que o ser humano se conhece como conhecendo Deus, quando ele não se conhece a si próprio? Porque certamente o ser humano não se conhece a si próprio nem às outras coisas, mas unicamente apenas Deus, em verdade, quando ele se torna e é bem-aventurado na raiz e no fundo da beatitude. Mas quando a alma reconhece que ela conhece Deus, ela adquire ao mesmo tempo o conhecimento de Deus e dela própria. [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Tratado da Nobreza 23

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 24

Ora, existe uma potência, como eu expliquei, graças à qual o ser humano vê, e uma outra, graças à qual ele sabe e reconhece que vê. É verdade que agora, aqui em baixo, em nós, esta potência pela qual nós sabemos e reconhecemos que vemos é mais nobre e mais elevada que a potência graças à qual nós vemos, porque a natureza começa a sua operação pelo mais baixo, enquanto que Deus, nas suas obras, começa pelo mais perfeito. A natureza faz o ser humano a partir da criança e a galinha a partir do ovo, mas Deus faz o ser humano antes da criança e a galinha antes do ovo. A natureza torna primeiro a madeira quente e abrasadora, e somente depois ela produz o ser do fogo, mas Deus dá primeiro o ser a todas as criaturas e em seguida no tempo, e portanto fora do tempo, separadamente, tudo o que pertence ao ser. Da mesma forma, Deus dá o Espírito Santo antes dos dons do Espírito Santo. [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Tra

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 25

Eu digo portanto que não há beatitude sem que o ser humano tenha consciência e saiba bem que ele contempla e conhece Deus, mas Deus quer que não seja essa a minha beatitude. Se isso é suficiente para outro, que ele fique por aí, mas eu tenho pena dele. O calor do fogo e a natureza do fogo são completamente diferentes e estranhamente distantes um do outro na natureza, apesar deles serem muito próximos um do outro no espaço e no tempo. A vista que é a de Deus e a nossa vista são absolutamente distantes e diferentes uma da outra. 1 Notas É preciso especialmente ter atenção a uma questão que poderia parecer à primeira abordagem como uma discussão de escola e que Mestre Eckhart tratou duas vezes ele próprio no seu comentário latino sobre São João: A beatitude da alma consiste na contemplação de Deus ou no conhecimento que ela tem disso? «Ora, pareceu a certos, e parece também muito verosímil, que a flor e o núcleo da beatitude se situam no conhecimento pelo qual o espíri

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 26

É por isso que Nosso Senhor tem razão em dizer que uma pessoa partiu para uma país distante afim de aí obter um reino e regressou em seguida. Esse ser humano deve ser um em si próprio e procurar esse um em si e no Um, e recebê-lo no Um, quer dizer unicamente contemplar Deus e «regressar», quer dizer saber e reconhecer que se tem um saber e um conhecimento de Deus. [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Tratado da Nobreza 26

Mestre Eckhart – Tratado da Nobreza 27

O profeta Ezequiel exprimiu previamente aquilo que está exposto aqui quando ele disse que uma águia poderosa, com grandes asas, com grande envergadura, coberta de todos os tipos de penas, veio à nobre montanha, agarrou a medula da árvore mais elevada, arrancou a coroa da sua folhagem e levou-a para baixo. Aquilo que Nosso Senhor chama uma pessoa nobre, o profeta chama uma grande águia. Quem é portanto mais nobre do que aquele que nasceu, duma parte do mais elevado e do melhor da criatura, e doutra parte do fundo mais íntimo da natureza divina e da solidão? «Eu quero conduzir a alma nobre na solidão e eu falarei ao teu coração», disse o Senhor no profeta Oséias. Um com o Um, um do Um, um no Um e, no Um, um eternamente. Amém. 1 Notas A data da redação do tratado Do ser humano nobre não deve ter sido muito afastada da redação do Livro da Consolação divina , cerca de 1310. Esta tradução foi realizada a partir da tradução francesa de Jeanne Ancelet-Hustache, «Maitre E

Mestre Eckhart – Sermão da Pobreza

Felizes são os pobres em espírito Há duas espécies de pobreza Pobre é quem não quer nada, não sabe nada, e não tem nada É pobre aquele que não quer nada Só é pobre quem não quer nada, e não deseja nada Quando eu estava na minha causa primeira Pedir a Deus para ser desprendido de "Deus" É pobre aquele que não sabe nada Existe na alma "qualquer coisa" de onde fluem o conhecimento e o amor É pobre aquele que não possui nada A pobreza mais elevada, a pobreza mais pura e a pobreza mais clara Nesta pobreza, o ser humano reencontra o ser eterno Tudo o que eu sou, eu sou-o pela graça de Deus Eu peço a Deus que ele me liberte de "Deus" O irromper é mais nobre que a difusão É uma verdade sem véu que veio diretamente do coração de Deus Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Sermão da Pobreza

Mestre Eckhart - Sermão da Pobreza 1

Sermão 52 - Felizes os pobres em espírito A beatitude abriu a sua boca de sabedoria e disse: « Felizes são os pobres em espírito porque o reino dos céus é deles. » 1 Todos os anjos, e todos os santos, e tudo o que alguma vez nasceu, deve ficar em silêncio quando fala a sabedoria do Pai, porque toda a sabedoria dos anjos, e de todas as criaturas, é uma pura loucura diante da sabedoria insondável de Deus. Esta disse que os pobres são felizes. Notas Por vezes chamado "Sermão da Pobreza", o Sermão 52 é um dos sermões mais famosos de Mestre Eckhart. Foi traduzido em latim e usado por um número de místicos posteriores, incluindo João Ruysbroec. O "Sermão da Pobreza" representa Eckhart no seu ponto mais desafiador. A organização do sermão, com a sua tripla análise da verdadeira pobreza - querer nada, saber nada, e ter nada - tem uma clareza incomum nos sermões de Mestre Eckhart. Parece estar entre os últimos sermões de Eckhart, possivelmente pregado

Mestre Eckhart - Sermão da Pobreza 2

Há duas espécies de pobreza: uma pobreza exterior, que é boa, e é necessário louvá-la altamente no ser humano que a pratica voluntariamente, pelo amor de Nosso Senhor Jesus Cristo, porque ele próprio a praticou sobre a terra. Desta pobreza eu não quero falar mais por agora; mas existe ainda uma outra pobreza, uma pobreza interior, aquela que é preciso entender pelas palavras de Nosso Senhor quando ele diz: « Felizes são os pobres em espírito. » Eu peço-vos que vocês sejam assim para poderem compreender este discurso, porque eu vos digo na eterna verdade: se vocês não estiverem conformes a esta verdade, da qual nós queremos agora falar, vocês não me podem compreender. 1 Notas Este sermão é provavelmente o mais difícil, de todos os que nos foram transmitidos, de Mestre Eckhart. É por isso que ele previne os auditores de que se eles não estão conformes à verdade que ele vai expor, eles não o poderão compreender. Um pouco mais adiante, ele insiste para que os que não o co

Mestre Eckhart - Sermão da Pobreza 3

Certas pessoas perguntaram-me o que é a pobreza em si própria, e o que é um ser humano pobre. Nós queremos responder a isso. 1 O bispo Alberto disse que um ser humano pobre é aquele que não se pode satisfazer com todas as coisas criadas por Deus, e são palavras certas. Mas nós diremos ainda melhor, e consideraremos a pobreza segundo um significado mais elevado: é um ser humano pobre aquele que não quer nada, e que não sabe nada, e que não tem nada. Falaremos destes três pontos, e eu peço-vos, pelo amor de Deus, de compreenderem esta verdade se puderem, e se não a compreenderem, não se preocupem, porque eu quero falar de uma tal verdade que poucas pessoas boas a podem compreender. 2 Notas A pobreza é aqui apenas o tema ocasional que permite reunir as intuições mais profundas de Mestre Eckhart: a identidade entre o fundo de Deus e o fundo do ser humano, a natureza "não-nascida" do ser humano, a dialética da " douta ignorância ", a ultrapassagem de

Mestre Eckhart - Sermão da Pobreza 4

Em primeiro lugar nós dizemos que é um ser humano pobre aquele que não quer nada. Certas gentes não compreendem bem este sentido; são as gentes que se agarram à penitência e aos exercícios exteriores, os quais estas gentes consideram ser importantes, porque elas se procuram neles a si próprias. Que Deus tenha piedade delas, por terem um tão fraco conhecimento da verdade divina. Estas gentes são ditas santas com base nas aparências exteriores, mas interiormente são burras, porque elas não sabem discernir a verdade divina. Estas pessoas repetem bem que um ser humano pobre é aquele que não quer nada, mas elas interpretam isso no sentido em que o ser humano deve viver sem nunca realizar em nada a sua vontade, e que para além disso se deve esforçar por realizar a muito cara vontade de Deus. Essas pessoas têm uma posição certa, porque a opinião delas é boa, nós as louvaremos portanto. Que Deus, na sua misericórdia, lhes dê o reino dos céus. Mas eu, eu digo na verdade divina

Mestre Eckhart - Sermão da Pobreza 5

Se me perguntassem o que é um ser humano pobre, que não quer nada, eu responderia: todo o tempo que o ser humano tem como sua vontade querer realizar a muito cara vontade de Deus - este ser humano não tem a pobreza da qual nós queremos falar, porque este ser humano tem uma vontade pela qual ele quer satisfazer a vontade de Deus, e essa não é a verdadeira pobreza. Porque se o ser humano deve ser verdadeiramente pobre, ele deve estar tão desprendido da sua vontade criada, como quando ele estava quando ele (ainda) não existia. Porque eu vos digo, pela verdade eterna: todo o tempo que vocês tiverem a vontade de realizar a vontade de Deus, e que vocês tiverem o desejo da eternidade, e o desejo de Deus, vocês não são pobres, porque só é um ser humano pobre aquele que não quer nada, e que não deseja nada. 1 Notas Talvez seja necessário ler a frase «... todo o tempo que vocês têm a vontade de realizar a vontade de Deus...» em função daquilo que se segue: «... e o desejo da eter

Mestre Eckhart - Sermão da Pobreza 6

Quando eu estava na minha causa primeira, eu não tinha Deus, e eu era a causa de mim próprio; então eu não queria nada, eu não desejava nada, porque eu era um ser livre, eu conhecia-me a mim próprio, desfrutando da verdade. 1 Eu queria-me a mim próprio, e não queria nada mais; aquilo que eu queria, eu era-o, e aquilo que eu era, eu queria-o; e lá eu estava desprendido de Deus e de todas as coisas, mas quando, pela minha livre vontade, eu saí, e recebi o meu ser criado, eu passei a ter um Deus, porque antes que existissem as criaturas, Deus não era "Deus", mas ele era aquilo que ele era. Mas quando passaram a existir as criaturas, e quando elas receberam o seu ser criado, Deus não era mais "Deus" em si próprio, ele passou a ser "Deus" nas criaturas. 2 Notas «Quando eu estava na minha causa primeira, eu não tinha Deus, e eu era a causa de mim próprio; então, eu não queria nada, eu não desejava nada, porque eu era um ser livre, eu conhecia-me

Mestre Eckhart - Sermão da Pobreza 7

Ora, nós dizemos que Deus, enquanto ele é "Deus", não é o fim supremo da criatura, porque enquanto ela está em Deus, a mínima criatura tem a mesma riqueza que ele. E se fosse possível que uma mosca tivesse um intelecto, e fosse capaz de procurar intelectualmente o abismo eterno do ser divino de onde ela saiu, diríamos que Deus, com tudo aquilo que ele é enquanto "Deus", não poderia dar a esta mosca plenitude e satisfação. É por isso que nós pedimos a Deus para sermos desprendidos de "Deus", e para acolhermos a verdade, e para desfrutarmos dela eternamente, lá onde os anjos mais elevados, e a mosca, e a alma são iguais, lá onde eu estava, onde eu queria aquilo que eu era, e era aquilo que eu queria. Nós dizemos portanto: se o ser humano deve ser pobre em vontade, ele deve também querer pouco, e desejar que ele quisesse e desejasse como quando ele não existia. E eis, de que maneira, é pobre o ser humano que não quer nada. 1 Notas Ora, ess

Mestre Eckhart - Sermão da Pobreza 8

Em segundo lugar, é um ser humano pobre aquele que não sabe nada. Nós dissemos por vezes que o ser humano deveria viver como se ele não vivesse nem para ele próprio, nem para a verdade, nem para Deus. Mas agora nós dizemos de modo diferente, e iremos mais longe dizendo que o ser humano (que deve ter esta pobreza) deve viver de tal forma que ele ignore mesmo que ele não vive nem para si próprio, nem para a verdade, nem para Deus; bem melhor, ele deve estar de tal forma desprendido de todo o conhecimento que ele não sabe, nem reconhece, nem sente que Deus vive nele; mais ainda, ele deve estar desprendido de todo o conhecimento que viva nele, porque quando o ser humano estava no ser eterno de Deus, nada mais vivia nele (para além do ser eterno de Deus), e o que vivia lá, era ele próprio. Nós dizemos portanto que o ser humano deve estar tão desprendido do seu próprio saber, tal como ele estava quando ele (ainda) não existia; que o ser humano deixe Deus operar aquilo que Deus quer,

Mestre Eckhart - Sermão da Pobreza 9

Tudo o que veio alguma vez de Deus tem por fim uma atividade pura, mas a atividade própria do ser humano é a de amar e de conhecer. Ora, a questão coloca-se em saber no que consiste essencialmente a beatitude. Certos mestres disseram que ela reside no conhecimento, outros dizem que ela reside no amor, outros dizem que ela reside no conhecimento e no amor, e estes dizem melhor. Mas nós dizemos que ela não reside nem no conhecimento nem no amor, mas antes que existe na alma "qualquer coisa" de onde fluem o conhecimento e o amor; "aquilo" não conhece nem ama como as outras potências da alma. Aquele que sabe "aquilo", sabe onde reside a beatitude. "Aquilo" não tem nem antes nem depois, não espera que nada lhe aconteça, porque "aquilo" não pode nem ganhar nem perder. É por isso que esse "qualquer coisa" também está privado de saber que Deus age nele, mas antes: esse "qualquer coisa" desfruta ele próprio de

Mestre Eckhart - Sermão da Pobreza 10

Em terceiro lugar é pobre o ser humano que não possui nada. Muitas gentes disseram que a perfeição consiste em não possuir nada de bens materiais, e é bem verdade num sentido, para aquele que o faz voluntariamente. Mas esse não é o sentido em que eu penso. 1 Notas Em terceiro lugar , a pobreza mais extrema é aquela do ser humano que não tem nada. Muitos pensam que essa pobreza é a da pessoa que não possui nenhum bem material, é verdade para aquele que o faz voluntariamente, mas existe uma outra pobreza. [  ↑  ] [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Sermão da Pobreza 10

Mestre Eckhart - Sermão da Pobreza 11

Eu disse previamente que é um ser humano pobre aquele que quer não realizar a vontade de Deus, mas que vive de tal forma que está liberto quer da sua vontade própria quer da vontade de Deus, tal como ele estava quando ele (ainda) não existia. Nós dizemos desta pobreza que é a pobreza mas elevada . Em segundo lugar, nós dissemos que é um ser humano pobre aquele que não sabe nada das obras que Deus opera nele. Aquele que está assim liberto de saber e de conhecer, tanto quanto Deus está liberto de todas as coisas - é a pobreza mais pura . Mas a terceira, da qual nós queremos falar agora, é a pobreza mais clara : a do ser humano que não tem nada. [ Anterior ] [ Índice ] [ Seguinte ] Início » Espiritualidade » Mestre Eckhart » Sermão da Pobreza 11

Mestre Eckhart - Sermão da Pobreza 12

Notem isto com aplicação e seriedade! Eu disse frequentemente, e os grandes mestres disseram-no também, que o ser humano deve ser liberto de todas as coisas, e de todas as obras, interiores e exteriores, de tal forma que ele possa ser um lugar próprio de Deus, onde Deus possa operar. Agora nós dizemos de modo diferente. Se o ser humano é liberto de todas as criaturas, e de Deus, e dele próprio, mas se ele ainda está tal que Deus encontra nele um lugar onde operar, nós dizemos: todo o tempo em que isto acontecer neste ser humano, este ser humano não é pobre da mais extrema pobreza. Porque, nas suas operações, Deus não visa um lugar no ser humano, onde ele possa operar: a pobreza em espírito, é que o ser humano esteja de tal forma liberto de Deus, e de todas as suas obras, que Deus, se ele quer operar na alma, seja ele próprio o lugar onde ele quer operar, e isso, ele o faz de boa vontade. Porque, quando ele encontra o ser humano tão pobre, Deus opera a sua própria obra, e o