Imitação de Cristo - 1.3. Da doutrina da verdade

  1. Feliz aquele a quem a verdade se manifesta tal qual ela é, e não por figuras e palavras efémeras, mas tal como ela é em si própria.
  2. A nossa opinião e os nossos juízos pouco alcançam e muitas vezes nos enganam.
  3. Para que serve saber especular sobre questões misteriosas e obscuras, de cuja ignorância não seremos repreendidos no dia do juízo?
  4. Grande loucura é desprezarmos as coisas importantes e necessárias, e apaixonarmo-nos pelas curiosas e nocivas. «Temos olhos e não vemos» (Salmos 115 (113b), 5).
  5. Que se nos dá dos Géneros e das Espécies dos Escolásticos?
  6. Aquele, a quem o «Verbo eterno» fala interiormente, não se preocupa com as opiniões desencontradas dos homens.
  7. Todas as coisas procedem e dão testemunho desse Verbo único, e é esse o «Princípio que também nos fala» (João 8, 25).
  8. Sem Ele, ninguém entende nem julga com retidão.
  9. Aquele que encontra tudo nesse Único, e refere tudo a Ele, e n'Ele vê tudo, terá o coração firme e permanecerá em paz com Deus.
  10. Ó Deus, verdade eterna, uni-me convosco em perpétuo amor.
  11. Estou farto de ler e de ouvir tantas coisas! Em vós, Senhor, encontro tudo quanto quero e desejo.
  12. Calem-se todos os doutores, emudeçam todas as criaturas na vossa presença: falai-me somente vós.
  13. Quanto mais estivermos recolhidos em nós próprios e mais desprendidos das coisas exteriores, tanto mais e maiores coisas entenderemos sem esforço, porque é do alto que recebemos a luz da inteligência.
  14. A alma pura, simples e constante, não se dissipa ainda que se ocupe em muitos trabalhos, porque faz tudo pela glória de Deus e em nada se busca a si própria.
  15. Nada te perturba e enreda tanto quanto os afetos não mortificados do coração.
  16. O ser humano bom e piedoso ordena primeiro no seu interior as coisas que tem a fazer.
  17. E não as ordena segundo o desejo da inclinação viciosa, mas sujeita-as ao arbítrio da razão reta.
  18. Quem se esforça por se vencer a si próprio tem de travar o mais renhido combate do mundo.
  19. E este deveria ser o nosso principal empenho: dominarmo-nos a nós próprios, a fim de nos tornarmos cada dia mais fortes e cada dia progredirmos no bem.
  20. Nesta vida não há perfeição que não seja acompanhada por alguma imperfeição, e todo o nosso saber não é isento de incertezas.
  21. O conhecimento humilde de ti próprio é um caminho mais seguro para Deus do que as profundas pesquisas da ciência.
  22. Isto não significa que a ciência ou qualquer outro conhecimento das coisas sejam maus. São bons em si e ordenados por Deus. No entanto, devemos sempre preferir a boa consciência e a vida virtuosa.
  23. Mas, porque muitos estudam mais para saber do que para viver bem, a cada passo erram e pouco ou nenhum proveito colhem dos seus estudos.
  24. Ah! se cuidassem tanto em arrancar os vícios e em plantar as virtudes como em ventilar questões, não haveria tantos males e escândalos entre o povo, nem tanta relaxação nas comunidades religiosas.
  25. Quando chegar o dia do juízo, não seremos questionados sobre o que lemos, mas sobre o que fizemos; nem se falamos bem, mas se vivemos como devíamos.
  26. Diz-me: onde estão hoje todos aqueles senhores e mestres que tu conheceste, enquanto viviam, e que tanto se distinguiam pelo seu talento?
  27. Já foram substituídos por outros e talvez já não haja quem se lembre deles. Em vida, pareciam valer alguma coisa; agora, já ninguém fala deles.
  28. Oh! como passa depressa a glória do mundo!
  29. Queira Deus que as suas vidas tenham correspondido ao seu saber! Porque então terão lido e aprendido com proveito.
  30. Oh! quantos há que se perdem no mundo devido a uma ciência vã que lhes fez esquecer o serviço de Deus!
  31. E, porque antes querem ser grandes do que humildes, desvanecem-se nos seus pensamentos (Romanos 1, 21).
  32. Verdadeiramente grande é aquele que ama Deus com todo o seu coração.
  33. Verdadeiramente grande é aquele que tem baixo conceito de si próprio e despreza as honras e glórias do mundo.
  34. Verdadeiramente prudente é aquele que «considera todas as coisas terrenas como sendo imundície, para ganhar Cristo» (Filipenses 3, 8).
  35. E verdadeiramente sábio é aquele que renuncia à sua própria vontade, para fazer unicamente a vontade de Deus.
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